Agroceres Multimix – Estratégias para minimizar os efeitos do estresse calórico em fêmeas lactantes
- 7 de março de 2022
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A suinocultura está relacionada à cinco princípios básicos, sendo eles o manejo, sanidade, nutrição, genética e ambiência, e deve-se atentar principalmente a este último quando se trata de conforto térmico das fêmeas lactantes. Quando o assunto é ambiência, é preciso levar em conta quatro elementos climáticos: a radiação, corrente de ar, temperatura e umidade do ar e se não forem monitorados, podem impactar diretamente na saúde e bem-estar animal (BELHADJ SLIMEN et al., 2016), afetar negativamente o desempenho produtivo e reprodutivo dos animais (AL-ZGHOUL et al., 2019) e acarretar em grandes perdas econômicas (ALVARENGA et al., 2011).
Para matrizes lactantes, considera-se como zona de conforto térmico de 18 a 22 ºC, e umidade relativa do ar de 40 a 70% (BORTOLOZZO et al., 2011). A hipotermia ocorre quando a temperatura corporal fica abaixo do limite fisiológico normal e a hipertermia ocorre quando a temperatura corporal fica acima do limite fisiológico normal. E para quando o animal mantém a temperatura corporal constante, ou seja, dentro do intervalo da zona termo neutra, chama-se homeotermia (FÁVERO et al., 2003). Quando as matrizes são mantidas em ambientes com temperaturas acima da faixa de conforto térmico ocorrem alterações comportamentais, fisiológicas e metabólicas para mantê-las em homeotermia, sendo possível observar altas taxas respiratórias, aumento das temperaturas da superfície corporal, retal e do úbere, menor consumo de ração e prolongamento da duração do parto. Por outro lado, quando as matrizes são mantidas em ambientes com temperaturas dentro da faixa de conforto, observa-se maior ingestão de ração, fêmeas mais calmas e maior peso de desmame (MUNS et al., 2016).
O Brasil é considerado um país tropical e a sazonalidade do clima brasileiro apresenta grande impacto na produção suinícola (BLACK et al., 1993). Considera-se que, no Brasil, o estresse por calor tem um alto impacto econômico na suinocultura, principalmente por causar redução no desempenho produtivo das matrizes suínas, gerando prejuízos próximos de U$ 113 milhões por ano (SOUZA et al., 2020). Para os suinocultores, além de representar alto custo, há uma dificuldade em adequar as instalações devido, muitas vezes, à estrutura ser antiga, à topografia da área e por não haver espaço suficiente para adequação e/ou ampliação das instalações. Mas algumas medidas podem ser tomadas para minimizarmos os efeitos causados pelo calor nas matrizes suínas.
Se a instalação estiver sendo planejada, é necessário que seja feito um estudo minucioso do clima do local onde será construída, sendo, possível projetar instalações aptas a minimizarem os efeitos deletérios do clima sobre os suínos. É importante verificar se há espaço disponível e topografia local, assim como a presença de barreiras naturais ou artificiais, controle da temperatura (máxima e mínima), umidade do ar, direção e intensidade do vento e, não menos importante, a orientação solar (CAMPOS ET AL., 2002). Vale ressaltar que os pontos supracitados devem estar respaldados pela legislação em vigor e das normas de proteção ambiental e bem-estar animal.
Em relação à localização, é preferível a escolha por lugares que permitam aproveitar as vantagens da circulação natural do ar, como por exemplo locais que possuam topografia plana ou levemente ondulada, (FÁVERO et al., 2003; BONETT & MONTICELLI, 2014). O espaçamento entre as instalações é um fator muito importante a ser considerado e deve ser suficiente para permitir a livre circulação do ar. É recomendável trabalhar com um espaço entre o primeiro e segundo galpão de dez vezes a altura do primeiro galpão, e um espaçamento entre o segundo e terceiro galpão de 20 a 25 vezes a altura do primeiro (Figura 2). Em situações em que o espaçamento entre galpões não está adequado, uma instalação se torna barreira artificial para outra impedindo a circulação do ar impactando diretamente na ventilação dos galpões. Neste caso, para buscar minimizar esse problema, realizar adequadamente a manutenção das árvores mantendo limpo as áreas entre os galpões e realizar um manejo de cortinas conforme a temperatura interna e correntes de ar pode auxiliar na melhor ventilação entre os galpões. Uma alternativa, é recorrer a ventilação foçada de pressão positiva (ventiladores) com intuito de melhorar e climatizar o ambiente interno.
A orientação solar é outro ponto que possui grande influência na temperatura ambiental interna. Avaliar o trajeto do sol e planejar a construção de forma com que o sol siga o eixo longitudinal dos barracões, no sentido Leste-Oeste. Dessa forma, é possível reduzir a incidência do sol dentro das instalações ou diretamente sobre as matrizes nas horas mais quentes do dia (Figura 3) (FÁVERO et al., 2003, BRIDI, 2007).
Após a avaliação dos fatores ambientais e características do local, é possível partir para o planejamento estrutural e definir as características construtivas dos galpões. Para definição da largura da instalação é necessário avaliar juntamente o clima local, número de animais a serem alojados, dimensionamento e disposições das baias. Para regiões com clima quente e úmido, normalmente se recomenda largura de até 10 metros, já para regiões com clima quente e seco, habitualmente, é utilizado largura de 10 a 14 metros (FÁVERO et al., 2003).
Com base no planejamento de produção e na topografia, é possível definir o comprimento do galpão, sendo necessário muita atenção para evitar problemas futuros com terraplanagem e distribuição de água (ABREU & ABREU, 2000). A altura do pé direito da instalação terá influência sobre a ventilação e na quantidade de calor vinda da cobertura sobre os animais, estando entre os pontos mais importantes para o planejamento. Manter os suínos à uma distância suficiente da superfície inferior da cobertura ajudará a reduzir a quantidade de energia calórica que os animais receberão na superfície do corpo. Para isso, é sugerido trabalhar com no mínimo 3,5 metros de altura do pé direito em regiões quentes (FERREIRA, 2012). Já Fávero et al. (2003) sugerem, como regra geral, trabalhar de 3 a 3,5 metros.
O tipo de material (madeira, metal ou pré-fabricado de concreto) a ser utilizado na cobertura terá influência sobre a energia radiante que chegará sobre os animais, e a escolha por materiais com grande resistência térmica ajudará a minimizar esse efeito. Para melhorar a eficiência da cobertura pode ser realizado a combinação do material com uso de isolantes térmicos (poliuretano, poliestireno extrudado, lã de vidro, manta asfáltica), segunda barreia física (forro), pinturas ou lanternim (FÁVERO et al., 2003; DIAS et al., 2011).
O uso de vegetações circundando os galpões auxilia na redução da radiosidade e da temperatura interna dos galpões (Figura 4) (CAVALHEIRO, 1994; FÁVERO et al., 2003 NÄÄS & JUSTINO, 2014). Há algumas plantas recomendadas para essa finalidade, e o ideal é a escolha por árvores caducifólias ou decíduas, ou seja, que mantém suas folhas durante o verão e que perdem suas folhas no inverno. O objetivo é fazer com que no inverno, quando suas folhas caem, ocorra uma maior incidência de sol permitindo o aquecimento da cobertura e no verão reduzir a incidência do sol, auxiliando no controle da temperatura interna. Ao longo dos anos, é necessário a manutenção e poda destas árvores, no qual é realizado a remoção dos galhos mais baixos que impediriam a circulação do ar e manutenção da copa. Assim como o uso de árvores, o plantio de grama circundando toda a estrutura auxilia na manutenção da temperatura, além de evitar erosões e facilitar a penetração da água da chuva.
Sistemas de refrigeração é uma excelente opção para melhorar a ventilação no ambiente ou até manter a temperatura estável e dentro do conforto térmico das matrizes lactantes (FÁVERO et al., 2003 NÄÄS & JUSTINO, 2014). O maior controle da temperatura dos galpões possibilita o melhor consumo de ração pelas matrizes e maior disponibilidade nutricional e, consequentemente, menor mobilização corporal dos tecidos para suprir a demanda necessária para manutenção corporal e de sua leitegada. Há diversos modelos de sistemas de refrigeração, cada um com suas particularidades. Para definir qual sistema utilizar, é necessário realizar uma avaliação geral do galpão com objetivo de definir qual sistema será mais efetivo e condizente com determinada estrutura.
Em galpões que não permitam grandes mudanças estruturais e/ou investimentos, devemos recorrer a outros meios como por exemplo a adaptação de equipamentos. Há alguns sistemas de refrigeração que não necessitam de grandes mudanças na estrutura. A adaptação de ventiladores, gotejamentos, resfriamento axial do ar na nuca das fêmeas são algumas dessas possibilidades para reduzir o estresse calórico (GAVA et al., 2010). A atenção com a qualidade da água e seu sistema de distribuição de água e readequação de manejos são outras possibilidades de buscar contornar os efeitos causados pelo estresse calórico.
A água é considerada um dos nutrientes mais importantes na suinocultura, e quando fornecida adequadamente auxilia na manutenção das funções do organismo (JEON et al., 2006). Como os suínos são animais homeotérmicos, possuem poucas glândulas sudoríparas e espessa camada de gordura, a disponibilidade de água fresca, de qualidade e à vontade ajuda a matriz a controlar a temperatura corporal, e consequentemente, reduzir o estresse calórico e seus efeitos negativos sobre o desempenho produtivo. Deve-se posicionar as caixas d’água em locais sombreados, realizar a limpeza periódica destas caixas, criar uma rotina de análise laboratorial da água, realizar a passagem da tubulação por paredes que haja menor incidência de sol e manutenção dos bebedouros vão auxiliar na disponibilidade de água de qualidade para o consumo dos animais.
A adequação dos horários de arraçoamento e/ou o fracionamento são estratégias para minimizar os efeitos do estresse calórico, então realizar o trato nos horários mais frescos do dia, início da manhã e final da tarde, ou até implantar um trato a mais durante à noite é uma forma de estimular o consumo de ração. O ato de umedecer a ração no momento do arraçoamento é outra forma de estimular o consumo e tem mostrado resultados significativos na produtividade das matrizes (GENEST & D´ALLAIRE, 1995; QUINIOU et al., 2000b).
O uso de sistemas de eletrônicos de alimentação têm se tornado uma ferramenta útil que permite distribuir o consumo diário em diferentes porções estimulando o aumento da ingestão total de ração, permitindo também a inclusão de arraçoamento durante o período da noite ou nos horários mais frescos do dia, reduzindo os efeitos do estresse calórico na produtividade das fêmeas lactantes (RUTLLANT, 2020). Com esta tecnologia é possível ajustar o fornecimento de ração conforme a necessidade individual das fêmeas (ordem de parto, dias de lactação) e monitorar precisamente e em tempo real o consumo individual possibilitando identificar aqueles indivíduos que apresentem consumo abaixo da curva definida e reduzir as perdas produtivas causadas por altas temperaturas. Além de permitir ajustar o consumo da fêmea conforme a necessidade e conforme o clima, esta tecnologia apresenta grande impacto na economia de ração por conta do baixíssimo desperdício.
A ingestão reduzida de ração e consequentemente de lisina digestível e outros nutrientes podem impactar na mobilização de diferentes tecidos corporais acarretando queda na produção de leite com redução no potencial de crescimento dos leitões e peso das leitegadas (YANG et al., 2000; LI et al., 2000), podendo também ocorrer aumento da mortalidade e redução no número de leitões desmamados (HURLEY, 2001). Relacionado a isso, ocorre um maior desgaste da fêmea durante a lactação reduzindo o desempenho produtivo e reprodutivo, nos ciclos posteriores (TOUCHETTE et al., 1998), como aumento do intervalo desmame-estro e dos dias não produtivos (HAESE et al., 2010). Em épocas de altas temperaturas, período este em que a fêmea reduz o consumo de ração, trabalhar com uma formulação mais concentrada e com níveis adequados de proteínas, amido e gordura, tem como objetivo fazer a fêmea ingerir as necessidades nutricionais diárias e reduzir a produção de calor endógeno. Essa concentração da ração, com redução de proteína bruta associada a inclusão de aminoácidos essenciais, mantendo o equilíbrio da dieta, pode ser uma boa alternativa para matrizes alojadas em ambientes com altas temperaturas (RENAUDEAU et al., 2001).
Os aromatizantes e palatabilizantes têm com uma de suas funções o estímulo de consumo de ração pelos animais. Segundo Silva et al. (2020), o uso de aromatizantes na ração pode estimular o consumo voluntário pela porca e mitigar as demandas da lactação. Em seu estudo, observaram que o grupo que recebeu ração com aromatizante apresentou até 24% a mais de consumo em relação ao grupo que consumiu ração sem aromatizante. Em um segundo estudo, foi utilizado um sistema automático de alimentação (gestal) para avaliar o impacto da suplementação dietética com o mesmo aroma na alimentação de porcas em lactação, no comportamento alimentar e na cinética de ingestão diária em condições tropicais. Foi verificado que as fêmeas que receberam ração com adição de aromatizante consumiram 6.417 gramas/dia, enquanto o grupo controle teve um consumo de 5.362 gramas/dia (SILVA et al., 2020).
Geralmente, esse quadro de hipertermia também leva à redução na atividade enzimática (superóxido dismutase, catalase, glutationa peroxidase) e de outras moléculas com propriedades antioxidantes (Vitaminas A, C e E, bilirrubina, ácido úrico, cisteína e GSH) responsáveis pelo combate aos excessos de radicais livres presentes no organismo (BARREIROS et al., 2006). A deficiência orgânica desses elementos com atividade antioxidante resulta em um quadro de estresse oxidativo, danificando moléculas e membranas biológicas, causando alterações na fisiologia e no desempenho dos animais (SURAI, 2002; SHI-BIN et al., 2007; RAHAL, et al., 2014; SZCZUBIAL, 2015). Frente a minimização dos efeitos do estresse oxidativo, a suplementação dietética com substâncias antioxidantes vem sendo uma das principais ferramentas de controle estudadas na comunidade científica. A suplementação dietética de α-tocoferol-selênio (Vitamina E) e ácido ascórbico (Vitamina C) para fêmeas durante a fase lactacional têm apresentado expressiva redução no estresse oxidativo e redução nos níveis de cortisol, aumento das concentrações séricas de imunoglobulinas e redução na taxa de mortalidade de leitões (GAYKWAD et al., 2019). A vitamina C é um dos antioxidantes biológicos mais eficientes e sua disponibilidade no tecido pode ser ajustado de acordo com mudanças na dieta (SHANG et al., 2002).
Conclusão
O estresse térmico possui grande influência no desempenho produtivo e reprodutivo das matrizes suínas em lactação. Animais submetidos a esse estresse passam por alterações comportamentais e fisiológicas, impactando diretamente no consumo de água e ração e consequentemente apresentam queda na produção de leite e redução no potencial de crescimento de suas leitegadas, apresentando queda na produtividade e influenciando diretamente na saúde financeira da granja. Assim sendo, torna-se necessário e indispensável a implantação de ações e estratégias que sejam eficientes na mitigação dos efeitos do estresse calórico e que minimizem as perdas produtivas e econômicas dos produtores suinícolas.
Fonte: Nutrição Animal – Agroceres Multimix